sábado, 2 de maio de 2009

Santa Sara Kali


Oração a Santa Sara Kali
Tu Sara Kali que estas no céu Olha para nós teus filhos que estamos aqui na terra, Nos cubra com sua misericórdia e amor, Que o seu manto nos envolva todos neste momento, Tirando de nos todas as tristezas, as doenças, as invejas, as magoas. Tu que sofreste em vida, sabe o que cada um de nós esta passando. Nos de força para superarmos todas as provações e as dificuldades, Que envolvidos por seu amor, sairemos ilesos de tudo isso. Tu minha Mãe Sara! Nos conceda saúde, felicidade, harmonia, prosperidade, amor, fé e paz de espírito. Segure em minha mão e como uma mãe bondosa que olha para uma criança nos leve para um caminhos que devemos trilhar. E nunca nos deixe cair nos os caminhos que nos levara para longe de ti. Santa Sara que eu seja digna do seu amor, e de sua proteção. Abençoe minha vida, a de minha família a de meus amigos e dos meus inimigos.para que assim ele possa distanciar de mim, e não mais me direcionar nem um mal. Permita que eu beijo suas mãos e o seu coração. Que eu seja sua filha abençoada para todo sempre. Amém.

Santa Sara Kali


Todos os anos, nos dias 24 e 25 de maio, milhares de Ciganos reúnem-se na cidadezinha de Sainte Maries de Ia Mer, na região da Camargue, sul da França, com o objetivo de cultuar Santa Sara, a santa católica da sua devoção. Toda a história das origens de Sainte Maries de Ia Mer está, na verdade, envolta nas brumas misteriosas do mito. Conta-se que, lá pelo ano de 48 depois de Cristo, uma barca aportou às margens do Mediterrâneo no lugar onde hoje se situa Sainte Maries de Ia Mer. Expulsos da Palestina, ou incumbidos pelo Cristo de propagar no mundo a fé cristã, estavam reunidos nessa barca vários personagens bíblicos: Maria Jacobina, a irmã da Virgem Maria, Maria Salomé, a mãe dos apóstolos Tiago e João, Maria Madalena, Marta, Lázaro, Maximino... e a serva das santas, uma negra de nome Sara. É Sara que os Ciganos vêm venerar todos os anos, por ocasião da grande peregrinação de 24 e 25 de maio. Mas Sara estava mesmo naquele barco, ou já habitava a Camargue no momento da chegada das santas, tendo decidido, por amor e piedade, ajudá-las nos caminhos difíceis do exílio? As lendas se misturam e as versões mais diversas são contadas. Alguns dizem que ela era uma antiga rainha das terras da Camargue; ou uma egípcia ou negra africana transladada para a outra margem do Mediterrâneo; ou uma sacerdotisa do antigo culto ao deus Mitra, de origem oriental; outros ainda pensam que Sara personifica uma antiga divindade fe¬minina telúrica dos celtas, uma espécie de Grande Mãe ligada à terra. Sara, na verdade, encarna a síntese de um mistério feminino cultivado ao longo de muitos séculos na região de Camargue, onde, como comprova a história, foram estabelecidas sucessivamente várias colônias de civilizações antigas a egípcia, a cretense, a fenícia e a grega. Vindos do mar em suas embarcações, grupos dessas culturas subiam o rio Ródano e penetravam fundo nas terras que são hoje a região da Provença, sul da França. Toda uma linhagem de poetas e menestreis provençais cantou a história de Sara, que teria sido, segundo eles, uma das primeiras convertidas ao cristianismo após a chegada dos exilados da Terra Santa. Por que os Ciganos a escolheram como santa padroeira? Para se responder a pergunta é preciso voltar no tempo, até as origens do Povo Cigano e sua chegada ao mundo ocidental. Sabe-se hoje que os Ciganos são originários do norte da índia. Seus dialetos todos deitam, sem sombra de dúvida, suas raízes no sânscrito arcaico. Localiza-se o início de suas migrações há cerca de mil anos, entre as margens do rio Indo e os confins do Afeganistão. Mas a//pré-história"do Povo Cigano é ainda obscura, e não se sabe quais as causas que o levaram a abandonar sua pátria para penetrar cada vez mais na direção do oeste. Os Ciganos aparecem a partir de 1322 na Grécia; na Valáquia em 1370. Em 1419 chegam à França. Há registros da sua presença na cidade provençal de Aries em abril de 1438. Isso os situa a apenas dez léguas de Sainte Maries de Ia Mer, dez anos antes da descoberta, neste último lugar, das alegadas relíquias das santas Maria Jacobina e Maria Salomé e também das relíquias de Sara. Os alegados despo-jos das duas primeiras foram guardados numa grande arca, colocada hoje num nicho na parte superior da Igreja de Nossa Senhora do Mar, arca esta exposta aos fiéis ao lado do altar principal durante a festa de 24 e 25 de maio. Os despojos de Sara foram sepultados na cripta da Igreja e é ali que se pode visitar, ao longo de todo o ano, a imagem negra que representa Santa Sara. Embora orgulhosos da sua misteriosa tradição religiosa original, fazem questão de preservar bem longe dos olhos dos não gadjos" os Ciganos costumavam oficialmente converter-se à religião dominante Í35 países onde se estabeleciam. Tal prática os ajudava a se defender melhor contra os preconceitos de que, em geral, eram vítimas. Foi ;i=im que na Europa e particularmente na França, eles se declararam zéis católicos. A partir disso, estabelecer, pelas vias do sincretismo, una relação devocional com Santa Sara não foi difícil. Sara, como eles, tem origens obscuras e a mesma pele morena trigueira dos povos da India. Como se isso não bastasse, é uma santa atípica, já que relacionada a um grande número de mitos pagãos. Considerada pela Igreja católica uma santa de culto local, que jamais passou processos regulares e completos de canonização, a figura de Santa Sara liga-se também a uma outra tradição cristã medieval que foi de grande importância na Europa: o culto às assim chamadas "virgens negras". Centenas dessas santidades femininas, representadas por estátuas de cor negra, eram adoradas na Idade Média por fiéis católicos que transformaram as igrejas onde elas se encontravam em verdadeiros santuários de peregrinação. Na França e na Espanha, principalmente, várias dessas imagens chegaram até nós e podem hoje ser admiradas, como é o caso de Nossa Senhora de Montserrat, em Barcelona; Nossa Senhora de Liesse; Notre Dame dês Mures, em Cornas; Notre Dame de Marseille, em Limoux; Notre Dame de Ia Negrette, em Espalion; Notre Dame de Mauriac; Notre Dame de Ia Délivrance, em Douves; Notre Dame de Puy; etc. Na realidade, todas essas virgens negras substituíram, num con¬texto cristão, as antigas divindades femininas pagas pertencentes às religiões pré-cristãs ligadas à Grande Mãe, a terra. Também os Ciganos traziam, das suas longínquas terras de origem, divindades femininas telúricas, representadas quase sempre por imagens negras. Tais arquétipos foram rapidamente associados à figura escura de Santa Sara, à maneira do que aconteceu no Brasil entre as divindades do panteão africano e os santos católicos. Por isso, até hoje muitos Ciganos se referem à santa com os apelativos de Sara, a Negra, e Sara, a Kali. Kali, como se sabe, é uma das principais deusas do panteão da índia, identificada aos aspectos criativo e destrutivo do princípio feminino. O momento culminante do culto a Santa Sara acontece na madruga¬da de 24 de maio e durante todo esse dia. A cripta subterrânea da igreja, localizada exatamente sob o altar principal e onde fica a estátua de Sara vestida de brocados e coberta de jóias, transforma-se numa literal chama ardente. A quantidade de velas acesas é tão grande que a tem¬peratura ambiente mais parece a de uma sauna escaldante. Somente por poucos minutos consegue-se permanecer ali dentro. Mesmo assim, a cripta permanece repleta de fiéis Ciganos por toda a madrugada. É impressionante, naquela luz espectral das velas, testemunhar as manifestações de fé desse Povo errante. Muitos, aos prantos, abraçam a estátua como se quisessem ser acolhidos no seio da Grande Mãe. Uns oram, outros invocam, outros parecem estabelecer um diálogo com a santa, falando nas suas línguas incompreensíveis para os poucos não-ciganos que se aventuram a penetrar no local naquela noite. O clima geral é quase o de um transe coletivo. Conta-se que, no passado, aconteciam ali dentro transes completos, quando alguns, de repente, "incorporavam" antigas divindades da religião Cigana diante das quais os demais se prostravam em atitude de respeito e veneração. As autoridades católicas, particularmente complacentes nessa região e em seu afã de catequizar os Ciganos, pouco ou nada interferiam nessas manifestações, já que tudo acontecia em nome de Santa Sara. Hoje, acompanhando curiosamente o crescente processo de sedentarização do povo Cigano, transes desse tipo são muito raros. Mas a intensa vibração de magia ainda permanece e qualquer pessoa razoavelmente sensível pode percebê-la. Às 15 horas do dia 24, uma procissão dos Ciganos sai da igreja para levar a estátua de Santa Sara ao mar. Um verdadeiro rio de gente Ci¬gana move-se pelas ruas de Sainte Maries de Ia Mer. Carregam .istosos estandartes e adereços, como miniaturas de antigas carroças Ciganas. A imagem da santa é protegida por um grande número de râvaleiros não Cíganos, homens brancos da Camargue, vestidos de rreto e carregando na mão direita uma espécie de longa lança. São os membros da Ordem de São Jorge, uma confraria cristã fundada em 1512, tradicionalmente encarregados da manutenção da ordem pública durante eventos como esse. Padres católicos, vestindo hábitos claros, oram e cantam hinos íitúrgicos com o uso de megafone, esforçando-se para incrementar o aspecto cristão da procissão. Mas o que sobressai, é mesmo a música dos Ciganos. Da procissão participam os vários grupos musicais que, auxiliados pela cantoria e pelas palmas ÍQG fiéis, imprimem à festa religiosa um incrível ar de imenso tablado andante de flamengo andaluz. Pouco a pouco a procissão chega ao mar Carregado por oito Ciganos robustos, o andor com a santa balança no ar quando os portadores pisam na areia da praia. Todos avançam mar adentro até a água chegar à cintura. E aí, algo mágico acontece; um silêncio vibrante parte daqueles que estão mais próximos da santa e vai, como uma onda, tomando conta da multidão que se imobiliza. O silêncio dura menos de um minuto, mas tem a força de uma eternidade. Enquanto dura, o tempo pára e Santa Sara, saída das profundezas da sua cripta, parece uma criatura viva a contemplar o mar até onde ele alcança o horizonte. O burburinho reaparece e a procissão faz o caminho de volta. No dia seguinte pela manhã, ocorre outra procissão, que também chega até o mar. Agora é a vez das imagens das santas brancas, Maria Jacobina e Maria Salomé, visitarem as águas do Mediterrâneo. As águas que há quase dois mil anos, conta a lenda, trouxeram-nas da distante Palestina até as terras da Camargue. Muitos Ciganos integram também essa procissão. Mas esta, embora possa competir em beleza com a anterior, não tem mais aquele fascínio quase pagão. Trata-se agora de uma festa devocional inteiramente cristã. Na tarde desse dia 25 de maio, os Ciganos pagam com alegria um tributo à Igreja católica pela liberdade, proteção e acolhimento que esta lhes proporciona. Atendendo a um apelo das autorida¬des eclesiásticas, líderes Ciganos e comitês representativos dos diversos grupos de peregrinos reúnem-se no interior da Igreja de Nossa Senhora do Mar. Diante do altarmor, fazem discursos emocionados, cantam ave-marías e outras músicas litúrgicas traduzidas para línguas Ciganas, prestam depoimentos onde afirmam sua fé e descrevem sinceramente os benefícios trazidos por sua aproximação ao catolicismo. No dia seguinte, as caravanas vão embora. Levam com elas o véu de mistério que durante uma semana cobriu Sainte Maries de Ia Mer. A pequena cidade volta a ser um balneário marítimo pronto para acolher, a partir de agora, as hordas de milhares de turistas, em sua maioria alemães que, não se sabe exatamente por quê, elegeram-na como um dos seus lugares preferidos para as férias de verão. Que Santa Sara proteja os seus Ciganos, fazendo com que, mesmo confinados no interior dos prédios de cimento armado da moderna Europa e das Américas, eles pelo menos nunca percam o seu maior bem: a liberdade que certamente mora em cada uma das suas almas. 
Texto extraido do livro Oráculo utilizados pelo povo Ciganos
Autor Pai Juruá
Sacerdote do Templo da Estrela Azul
Editora Alfabeto


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